Hoje,
dia 01/02/2021, há uma ameaça de greve dos caminhoneiros para pressionar o
Governo por algumas pautas.
Entre
os itens na pauta de reivindicações, está a insatisfação pela alta frequente do
óleo diesel, insumo principal no custo da atividade da categoria.
Desde
a saída do PT do Governo, a Petrobrás adotou a paridade internacional do preço
de combustíveis ao mercado interno. A cada subida em dólar do produto, há uma
adequação do preço interno àquele internacional.
A
alegação é que a Petrobrás, como empresa de capital aberto, com ações em bolsa
de valores, não pode subsidiar o combustível, em detrimento dos seus
acionistas. E isso, sob a ótica do investimento está correta. Quem compra uma
ação, quer se beneficiar de parte do lucro da empresa investida. E quer e tem
direito a uma governança que busque otimizar o resultado. Subsidiar o preço não
está no rol das ações esperadas pelos investidores, uma vez que isso corroe as
margens e leva a uma situação de insolvência futura.
As
investigações que ocorreram no âmbito da Operação Lava-Jato encontrou forte
esquema de corrupção na empresa e sabemos aonde isso levou. Não é o tema desse
post aqui. Toda essa história levou a uma crise sem precedentes na empresa, que
chegou a ter sua ação cotada em bolsa a valores abaixo de R$ 5 reais. E um dos
fatores foi a deterioração do seu resultado ao longo do tempo e o alto endividamento
em dólar. Mas a causa principal do aumento do endividamento foi sem dúvida o
subsídio ao combustível nos tempos dos governos petistas, e menos a corrupção.
O combustível, como insumo básico de toda a economia, e principalmente na
nossa, cuja matriz rodoviária é ainda o principal modal, é um componente com
peso forte na inflação. E inflação alta e persistente em um núcleo importante é
certeza de necessidade de o Banco Central adotar uma taxa de juros alta.
O
esquema simplificado é:
Aumento
dos combustíveis => inflação => juros altos
Portanto,
parece não haver dúvidas de que o preço do combustível e da energia como um
todo é assunto estratégico que governo nenhum pode negligenciar. Deixar essa
pauta inteiramente sob as forças do mercado e sem qualquer regulamentação ou
até intervenção, não parece ser a ação certa a ser adotada.
Aí
chegamos num impasse. A Petrobrás não pode subsidiar o combustível, pelo seu
dever legal e estatutário perante os acionistas. O Governo não pode deixar o
mercado regular sozinho, pois isso pode prejudicar a economia, provocar
inflação e em última instância, exigir taxas de juros altas, freando o
crescimento econômico e a geração de empregos.
Mas,
antes de desenvolver uma possível solução para o impasse acima (se é que há
solução para isso), vamos voltar ao negócio da Petrobrás. Os custos dela para
pesquisa, exploração e extração do petróleo bruto é, em parte, em reais. Sua
mão-de-obra é paga em reais. Mas também há componentes em dólar, como as
dívidas contraídas, os equipamentos, as plataformas e outros insumos da
produção, que são importados. No entanto, se o real se desvaloriza, sua receita
com a venda da produção é em dólar. Portanto, há uma vantagem também para a
empresa quando o real se desvaloriza.
Mas
o problema é que não consumimos a produção da Petrobrás (não integralmente).
Ela exporta o óleo cru e importa os derivados que precisamos. Sua produção é
insuficiente para a demanda interna. E qual seria a solução para isso? Investir
em refino para ser autossuficiente. Aí não dependeríamos de importação e a
paridade ao preço internacional não faria sentido.
Nos
últimos anos, a Petrobrás investiu pesado em grandes refinarias, como a
Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, por exemplo. A estratégia parecia
correta, visando a aumentar o refino interno e substituir importações. Mas
estamos no Brasil. E como diz o ditado, "O Brasil não é para
amadores". E essas obras foram alvo de superfaturamento, alta corrupção,
desvios, que culminou com o que viemos a conhecer como Petrolão. Onde tem
dinheiro público (a carniça), os urubus estarão lá para se locupletar. O
resultado de tudo isso é que a Petrobrás, no atual governo dito liberal, quer
vender todas as refinarias já em funcionamento, para entregar ao mercado e
gerar uma suposta concorrência. Setor privado quer refinaria pronta, sem riscos
e com preço em dólar garantido para ter lucro certo. Em detrimento de todos nós
brasileiros.
No
mundo das fadas e dos duendes, a autossuficiência resolveria o impasse. O
combustível seria produzido internamente e seria vendido por um preço que
cobrisse os custos, as despesas e mais a margem de lucro necessária para a
Petrobrás continuar a investir e aumentar sua produção e ao mesmo tempo
remunerar seus acionistas. A parte dolarizada do custo seria compensada com o
excedente de óleo cru exportado e não refinado internamente. Atenderia aos
interesses do acionista e concomitantemente aos consumidores brasileiros do
combustível, que não estariam sujeitos à volatilidade cambial e à indexação
desse insumo.
Aliás,
esse tópico precisa ser melhor explorado. Por que o petróleo precisa ser
indexado ao dólar, se não ganhamos em dólar? Não vivemos em uma economia
desindexada desde a implantação do Plano Real? Pelo menos esse foi o espírito
inicial esperado daquele plano. E a manutenção desses pilares foi o que fez
termos uma inflação controlada nesses mais de 26 anos de real, com pequenos
surtos concentrados de inflação, como ocorreu com a energia elétrica, logo
solucionado. O fim da correção monetária, dos gatilhos salariais e de toda
forma de indexação foi abolida para termos uma moeda que não perdesse o poder
de compra de forma acelerada como nos anos 80 (hiperinflação).
A
volta de um indexador para o combustível (pós 2016), um dos principais insumos
de toda a economia, como já mencionado, gera uma reação em cadeia que exige que
esses aumentos sejam repassados para os preços. Isso é tão verdade que a
inflação permanece viva até hoje. E a baixa atual dos juros é artificial e não
sustentável, uma vez que temos hoje juros reais negativos. A economia está tão
doente que nem uma superdosagem de juros baixos tira ela do coma profundo em
que se encontra.
Se a
Petrobrás precisa ser um instrumento do Governo para controlar, regulamentar e
prover o país de fonte de energia essencial à população e às empresas, ela tem
objetivos que fogem estritamente ao que busca uma empresa privada: máximo
retorno aos acionistas. Aí chegamos na afirmação que intitula esse artigo: a
Petrobrás não deveria ser uma empresa de capital aberto.
Mesmo
assim, sucessivos governos tem mantido ela assim: ela tem capital aberto desde
1957, e cada acionista que decidiu pôr as suas economias nessa empresa, já
sabiam da condição de estatal estratégica e cujo objetivo nunca foi somente o
lucro. O ideal era que fosse exclusivamente estatal, mas o fechamento de
capital parece algo distante e acho que jamais cogitado, pela impossibilidade
de o Governo ter dinheiro suficiente para isso. E a Petrobrás nessa nova
condição (na hipótese de integralmente governamental) teria dificuldades para
captar recursos para seus investimentos e o controlador não teria condições
orçamentárias de fazê-lo.
Então,
depois de toda essa discussão, há solução para o impasse citado? A
autossuficiência em derivados, via investimento em refino resolve o problema?
Em parte, entendo que sim. Mas com todos os problemas que já foram enfrentados
de superfaturamento, corrupção, etc. Se os Órgãos de controle e a Justiça
puderem inibir essa prática, ao final teremos um parque de refino que atenda à
demanda interna. A outra parte da solução é a conscientização do investidor de
que, ao escolher aportar valores na Petrobrás, estará ciente de que ela é
instrumento do Governo para políticas que vão além do lucro, cujas regras devem
ser bem definidas no Estatuto da empresa e que implementem garantias mínimas de
retorno ao acionista, uma espécie de dividendo mínimo obrigatório a ser
distribuído periodicamente. Poderia ser uma lei específica para as estatais,
obrigando à distribuição de parcela significativa (90% ou mais do lucro, após
deduzir o orçamento de capital necessário aos investimentos), semelhante ao que
ocorre com os fundos imobiliários. Outras vantagens, como isenção sobre o ganho
de capital na negociação das empresas estatais seria outro atrativo para quem
investisse na empresa.
Essa
foi a ideia e vou resumir, para que as estatais continuem com capital aberto:
1. Lei
específica para investimento em ações em bolsa de companhias estatais abertas,
com regras diferenciadas e vantagens ao acionista;
2. Distribuição
do lucro integralmente ou superior a 90% ao acionista minoritário, após
deduzido o valor para investimentos. O Acionista controlador não seria
remunerado via lucro. É como se essa sua parcela a que tem direito, ele usasse
para os subsídios necessários para manter o preço do combustível controlado e
outras intervenções;
3. Isenção
para os dividendos (o que já ocorre hoje, mas pode ser alterado) e para o ganho
de capital na negociação dessas ações, como atrativo para continuarem
investindo nela.
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