Na semana passada o
COPOM - Comitê de Política Monetária do Banco Central baixou a taxa básica de
juros, a SELIC, para 5,5%, o menor patamar desde que a taxa foi criada.
O Comitê entendeu
que o cenário para a inflação é benigno e o cenário externo permite esse
afrouxamento. O que isso implica para o investidor? Quais as consequências
macroeconômicas que influenciam os investimentos com esse novo cenário de juros
menores?
A primeira
implicação é que a renda fixa de um modo geral renderá menos. Os títulos do
Tesouro Direto renderão menos, pois de uma forma ou de outra estão atrelados a
essa taxa. O Tesouro Selic rende a taxa efetiva. Os prefixados se ajustarão
para baixo e hoje está em 6,71%, para um título com vencimento em 2025. O
Tesouro IPCA pagará a inflação e mais um pouco de juros, sendo esse plus cada
vez menor.
A poupança pagará
70% da Selic mais a TR, que há dois anos está zerada. Portanto, renderá 3,85
anuais (70% x 5,5%), o que equivale a um rendimento pouco maior do que 0,30% ao
mês.
Os fundos de renda
fixa ou até os de outra categoria, cujo portfólio inclui boa parte em títulos
públicos e privados também serão afetados e pagarão taxas menores. Descontados
os impostos e a taxa de administração ficarão pouco atrativos. Não faz muito tempo,
havíamos entrado em a uma nova realidade de que não ganharíamos nem 1% ao mês
na renda fixa. A nova realidade é que não ganharemos nem 0,50% ao mês.
Diante de todo esse
cenário de rendimentos decrescentes para a renda fixa e para os investimentos
com menos riscos, obriga-nos a alocar parte do capital em ativos mais
arriscados e que tenham retornos compatíveis com esse aumento de riscos. E o
principal é a renda variável.
Se quisermos ter
bons retornos na nossa carteira, boa parte terá que estar em ações. Mas com o
IBOV nesses níveis ainda há espaço para entrar?
A queda dos juros é
positiva para a economia como um todo, pois torna o custo de oportunidade mais
baixo para abrir um negócio ou ampliar um existente. É claro que a queda da
taxa básica precisa chegar na ponta e isso não ocorreu ainda. Os spreads bancários
são muito altos, sempre com a desculpa de que a inadimplência impede isso
devido aos custos para quem empresta. Mas isso não é totalmente verdade e essa
caixa-preta precisa ser aberta. Há espaço para queda de juros em empréstimos
pessoais e há meios de diferenciar um bom pagador de um contumaz caloteiro. O
cadastro positivo é uma dessas iniciativas para formar um bom histórico do
consumidor/cliente.
Para as empresas, o
custo de financiamento tende a cair, diminui a alavancagem e as despesas
financeiras, revertendo-se em aumento das margens e, claro, dos lucros.
Portanto, as ações sobem num cenário de juros baixos, movimento amparado em
benefícios reais para as empresas. Para que a escolha recaia sobre bons ativos,
a análise de valuation sempre será necessária. O acompanhamento dos principais
indicadores como P/L, P/VP, P/Ebit, índices de liquidez, de endividamento,
margens, indicarão se aquele ativo já está bem precificado ou ainda tem margem
de segurança para investir. Importante verificar quais os setores que mais se
beneficiarão com a queda dos juros. Como exemplo, o setor de varejo tende a
performar bem nesses cenários. As empresas exportadoras podem se beneficiar se
o dólar se valorizar em relação ao real. Com câmbio mais favorável, o produto
nacional ficará mais atrativo em moeda forte. O setor de construção civil pode
se beneficiar se os juros dos financiamentos acompanharem a queda da taxa
básica. Enfim, essa análise sobre o impacto em cada setor definirá em quais
ativos alocar o capital.
Outra alternativa de
investimento são os fundos imobiliários. Os alugueis em princípio não são
afetados com juros baixos. A tendência aliás é de aquecimento da economia, com
aumento na demanda por galpões, pontos de venda, lojas em shoppings, enfim,
todos esses ativos que compõem os fundos imobiliários. Isso fará o preço das
quotas desses fundos subirem também. Teremos que ser seletivos para não
pagarmos valores acima do valor patrimonial desses fundos. Pode-se verificar o
índice P/VP, que é o Preço dividido pelo Valor Patrimonial. Valores acima de 1
indicam que você se está pagando um ágio sobre o seu valor contábil, embutindo
um crescimento futuro dos seus retornos. Parece razoável não pagar muito mais
do que 20% de ágio. Outros indicadores também precisam ser observados como
dividend yield, a vacância etc.
Os benefícios de
juros baixos ao longo do tempo tem um limite perigoso que é a possível formação
de bolhas. Se os juros caem em patamares muitos baixos por um longo período
tende a inflar o preço dos ativos, como imóveis, ações, etc. A ata do COPOM
sinalizou novos cortes futuros e os agentes do mercado já vêem a taxa chegando
a 4,5%. A crise de 2008/2009 do subprime foi resultado de anos de juros baixos.
O acesso ao dinheiro estando barato, os preços relativos dos bens sobem acima
do razoável. Gera um excesso de liquidez que precisa encontrar um destino para
serem aplicados em busca de rendimento. E isso pode influenciar artificialmente
os preços dos ativos.
A quantidade de
investidores em renda variável cresceu muito no último ano e ultrapassou 1
milhão de CPFs na bolsa brasileira. Muita gente nova e ainda sem muito
conhecimento para escolher bons ativos. Ainda estão na curva de aprendizado. O
aumento da demanda por essa classe de ativos justifica em parte a subida do
Ibovespa. É razoável supor que muitas escolhas são feitas sem muito critério,
por falta de conhecimento, por ganância em ver ativos subirem forte, entre
outros vieses cognitivos. Não tenho dúvidas e acho que os mais escolados também
não têm, de que muitos ativos já estão excessivamente valorizados. Para
reforçar o argumento, nos últimos meses os investidores estrangeiros têm
operado na venda no mercado à vista, mas isso não fez o índice cair. Sinal de
que os investidores locais estão comprando e comprando forte. Há um certo
excesso de otimismo na bolsa e isso pode não acabar bem, na hipótese de uma
tempestade vinda de fora.
A migração de
recursos da renda fixa para a renda variável está a pleno vapor. Muitos de nós
estamos abrindo mão de um rendimento líquido de 4,5% ao ano de forma
relativamente segura, em busca de melhores retornos. Talvez não estejamos
visualizando os riscos. Estarão preparados para uma queda, mesmo que temporária
de 20%, 30% ou até 50% em sua carteira? Infelizmente a resposta é não. Mas não
tem outro jeito. O mercado de ações ainda não está totalmente desenvolvido no
Brasil e isso pode está mudando. Ainda apanharemos muito até que esse mercado
esteja sólido, as pessoas estejam mais conscientes do que é renda variável e
façam boas escolhas dentre as opções disponíveis.
Para finalizar: a
busca por independência financeira e construção de um patrimônio para o futuro
requer sem dúvida que invistamos em renda variável, nesse cenário novo de juros
baixos. Que façamos boas escolhas, tarefa nada fácil. E torcer para que ventos
exteriores estejam favoráveis para surfarmos um bom período de alta na bolsa.
Há nuvens negras no horizonte, mas esperemos que faça sol!
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