A expressão "Cisne Negro" foi utilizada pelo autor Nicolas Nassim Taleb no seu livro "A Lógica do Cisne Negro", de 2008, para designar aqueles eventos raros, imprevisíveis e de forte impacto. Esses acontecimentos não se enquadrariam numa distribuição normal de probabilidade, que ele chama de curva em forma de sino. Seriam eventos de cauda, fora da possibilidade de serem detectados pela sua rara ocorrência. 

O matemático americano John Casti define algo parecido em seu livro "O Colapso de Tudo", de 2012. Ele conceitua, o que ele denomina de eventos extremos ou eventos X, aqueles acontecimentos surpreendentes que, embora raros podem até ser esperados. O fator surpresa reside no "quando" e "onde" eles possam ocorrer, ponto onde ele converge com o conceito do Taleb, ao concordar na impossibilidade de previsão de tais fatos.

O importante é que ambos falam desses eventos extraordinários que podem causar muitos estragos sejam em vidas humanas, sejam em prejuízo material. E esse último aspecto é o que nos interessa quando falamos de investimentos. Que eventos deveríamos temer para não sermos levados à ruína financeira e o que poderíamos fazer para minimizar o seu impacto?




O principal e mais óbvio desses eventos (se é que podemos usar essa palavra para esse tipo de acontecimento) seria uma crise financeira global, nos moldes da que ocorreu em 2008, a crise do subprime americano, com consequências que duram até hoje e da qual ainda não saímos. Estaríamos próximos de um evento dessa magnitude? 


Para ilustrar a questão, nos últimos 25 anos tivemos a crise do peso mexicano (1994), a crise dos tigres asiáticos (1997), a crise da moeda russa (1998), a crise das pontocom (2000), a grande recessão, já citada, em decorrência da bolha imobiliária americana (2008-2009) e a crise da dívida na Europa, principalmente da Grécia (2009-2010). Isso dá uma média de uma crise a cada 4 anos. Essa situação se aproxima mais da ideia do John Casti, que não são tão imprevisíveis assim, apenas surpreendentes no que se refere ao momento e ao local da ocorrência. Observando o fato de que a última citada foi há 9 anos atrás, parece que já estamos no lucro.

Examinando o cenário internacional do momento, uma crise poderia brotar de qualquer fato, mas a título de exemplo: desfecho inesperado na disputa comercial entre EUA e China, paralisando o comércio global; problemas com a dívida americana que já ultrapassou os 22 trilhões de dólares, com perda de confiança nos títulos americanos; nova crise do petróleo provocada pela invasão americana à Venezuela, com intervenção da Rússia e/ou da China, alçando o confronto à situação de um conflito mundial; impeachment do Trump, empurrando os EUA para uma crise política de consequências imponderáveis; nova crise de dívida na Europa, diante do baixo crescimento e do fracasso dos estímulos do Banco Central Europeu etc.

No cenário interno, poderíamos exemplificar alguns: incapacidade do governo em formar uma coalisão consistente, provocando em última instância o impeachment de Bolsonaro;  interrupção no pagamento da aposentadorias e pensões, diante da falta de recursos pela não-aprovação da reforma da previdência, provocando revolta na população; conflito armado entre Brasil e Venezuela, com apoio do EUA de um lado e China/Rússia do outro etc.

Escrever uma lista dessas possibilidades chega a ser divertido, mas não há como esgotar as possibilidades, pois é infinita, e qualquer dos exemplos citados, além de outros,  não estão só no campo do possível, como até do provável. O que poderia fazer o investidor para estar preparado para algo do tipo? O ideal no caso da renda variável seria ficar completamente de fora, com todo o capital investido em algo seguro e líquido, à espera de uma queda que poderia chegar a 80% do valor de mercado de algumas empresas, inclusive aquelas ditas de valor. Enfim, comprar boas empresas com um desconto extraordinário. Mas isso é mesmo possível e recomendado? No caso de uma crise realmente impactante, existiria esse investimento seguro e líquido, uma vez que o impacto se alastra inclusive para a renda fixa e outros ativos ditos seguros? E a que preço teríamos que transformá-lo em dinheiro para se reposicionar?

No meu último artigo "A Reforma da Previdência e os Eventos Binários" eu menciono a impossibilidade de ficar de fora do mercado à espera do desfecho de acontecimentos, sob pena de não se investir em coisa alguma. O mesmo ocorre em casos de crises. Sabemos que elas irão ocorrer, mas precisar o momento e o local é realmente impossível. Diante dessa incerteza, temos que continuar investindo o nosso dinheiro da melhor forma possível. 

O próprio Nassim Taleb, citado no início desse artigo, aconselha o uso de uma estratégia, que ele denomina de Estratégia Barbell, que consistiria em alocar a maior parte do capital em ativos extremamente seguros e uma pequena parte em ativos arriscados. Essa ideia permitiria ao investidor proteger a maior parte do capital e essa pequena parte resultar em grandes ganhos.

Seja qual for a estratégia escolhida, devemos ter em nosso portfólio ativos antifrágeis (aqui outro conceito explorado pelo Taleb em outro livro), que são aqueles que se beneficiariam com o caos. Poderia ser dólar, ouro, opções de venda dos ativos da carteira ou de outros etc. Enfim, ativos que teriam correlação inversa ao seu portfólio. Você seria afetado pela crise em parte do seu capital, mas sobreviveria ao processo.

Se me perguntarem se está próximo de ocorrer algo do tipo, eu opinaria que sim, está bem próximo, às portas. Acho até que esse cisne negro está bem atrasado. De onde virá e qual o fator que desencadearia tal crise, aí eu não sei responder e ninguém sabe. Estejamos preparados!