O economista, filósofo e escritor americano John Kenneth Galbraith, explanou em seu livro "A Sociedade Afluente" um conceito interessante  perfeitamente aplicável à atualidade, chamado "Sabedoria Convencional".

 

Para ele, a sabedoria convencional é aquela força que impele o "status quo" a defender as ideais estabelecidas como verdade e aceitas pela elite influente. Persiste entre os defensores uma certa teimosia na manutenção das ideias amplamente aceitas e que mantém uma certa estabilidade. Muitas vezes a retórica dos defensores prega a inovação e as novas ideias, mas apenas para enfatizar e reforçar os velhos axiomas sedimentados.

 

Até mesmo na comunidade científica existe esse fenômeno. As ideias que contestam descobertas até então cristalizadas, são fortemente rechaçadas quase como dogmas religiosos e só depois de amplamente provadas e contraprovadas é que vão sendo incorporadas à ciência. São os fatos desmentindo ideias preconcebidas e fortemente protegidas pelo stablishment.

 

O autor afirmou categoricamente que "o inimigo da sabedoria convencional não são as ideias, mas a marcha dos acontecimentos". Assemelha-se a um outro conceito que abordei noutro post intitulado "Resiliência Insensata" e que recomendo a leitura. Os fatos se sobrepõem às ideias insistentemente defendidas por aqueles que tem interesses na manutenção da estrutura posta até então. Parece a resiliência insensata em um sistema complexo que, por não aceitar a dinâmica natural da mudança, acaba provocando a sua ruína.

 

O conceito aqui abordado é muito apropriado quando aplicado à economia. Os conceitos que a economia utiliza para fabricar os seus modelos são amparados em premissas que se enquadram na categoria "sabedoria convencional". Por exemplo, podemos citar a definição de "homo economicus". Para a economia, o homem, nas suas relações de troca na sociedade, sempre opta pela melhor alternativa na alocação dos seus recursos, ou seja, age de forma racional. Sabemos empiricamente que isso passa longe da verdade. O consumidor, um dos papeis do homem na vida econômica, não escolhe comprar bens e serviços para satisfazer suas necessidades de forma racional. Ele é influenciado pelas campanhas de marketing e pelas técnicas de venda, que plantam e "criam" necessidades das quais ele antes não tinha consciência de as possuir. Aliás, esse é outro assunto abordado pelo Galbraith, contestando o conceito de "soberania do consumidor" tão utilizado e aceito pela economia. O surgimento das necessidades do consumidor faria os produtores agirem para satisfazer essas necessidades. Na verdade, ocorre o contrário: os produtores criam os bens e provocam no consumidor o desejo de os possuir, por meio do marketing e das técnicas de venda. Esse foi apenas um exemplo, entre diversas premissas utilizadas nos modelos econômicos que não se coaduna com a realidade. É o caminhão dos fatos atropelando as ideias equivocadas, e sem nem tempo dessas anotar a placa daquele.

 

Outros aspectos do comportamento do indivíduo influenciam a sua atuação no ambiente econômico e que não passam necessariamente pela razão, mas por sentimentos diversos como medo, inveja, desejo etc, melhor estudados pela Psicologia e pela Economia Comportamental.

 

Como isso se relaciona com os nossos investimentos e com o momento atual? Bem, há também outra "sabedoria" defendida amplamente pelos liberais, que é o equilíbrio das contas públicas a qualquer custo e em qualquer situação. Os fatos já solaparam essas ideias, pois em uma economia em recessão ou depressão, medidas anticíclicas precisam ser tomadas para fazer a roda novamente girar. E é o caso agora, como foi também em 2008, na crise do subprime. O Estado terá que agir no estímulo à atividade e no suprimento da liquidez e da renda das pessoas mais vulneráveis, para que a queda na atividade não seja tão grande, embora isso seja quase inevitável. O incrível é que o ministro atual da economia continua defendendo o enxugamento da economia, a aprovação de reformas e a diminuição do papel do Estado, quando todos os fatos e até a experiência dos outros países tem feito o contrário.

 

O mercado tem subido desde a eleição, por conta do viés liberal do governo atual. E quando aparenta que o governo se fortaleceu, especialmente a equipe econômica, o mercado responde com altas. E ao agir ignorando os fatos parece em princípio ser positivo para o mercado. Mas a marcha dos acontecimentos mostrará que essas são ideias defendidas pelo 'status quo" empacotadas em uma "sabedoria convencional" que não se sustentará.